Há um tempo, já alguns meses, meu amigo João Carlos Sampaio postou em seu perfil no Facebook uma foto dele criança, num jardim caseiro, em que, ao fundo, vê-se uma senhora catando flores.
Na legenda, o seguinte texto:
“Sempre que olho essa foto (minha amada vó ao fundo) fico pensando se eu consegui ser justo com este menino, o que fiz dele... o que faço dele todos os dias... esse garoto, com um olhar tão intenso, me cobra muito... não sei se o decepcionei, se o decepciono... é tão difícil!”
Olhar minha vida sob esta perspectiva passou a ser um impulso frequente: será, Paula Berbert, que você está honrando o sorriso puro e cheio de esperança da criança que você foi? Será este o futuro que aquela menina merece?
Quando vejo minhas fotos de infância, sorrio para meus próprios olhos tão brilhantes e puros, reflexo de uma felicidade ingênua que existia apenas ali, em cada instante registrado de um tempo em que a vida se justifica em cada lúdico segundo de liberdade plena. Então eu penso: todas as crianças deveriam mesmo poder ser livres. E me entristeço por aquelas que não são.
A criança que eu fui não foi personagem dos melhores contos de fada. De forma alguma. E falar disso me faz lembrar de quando minha então recém-nascida irmã foi fazer o teste do pezinho e abriu um berreiro apavorado, soluçado. No mesmo instante, uma neném ao lado, ao ter o calcanhar furado, permaneceu imóvel e calada. A mãe justificou: ela nasceu pré-matura, acabara de sair de longo período no hospital, passou todos os dias desde o nascimento tomando injeções. Devia estar achando que viver era sinônimo de levar agulhadas. As crianças se adaptam com a facilidade de quem ainda não foi enrijecido pela dor. E me entristeço por aquelas que têm de conviver cotidianamente com o sofrimento.
Felizmente, as lágrimas de minha infância não foram ignoradas e meu pai, na infinita sabedoria de seus 20 e poucos anos, não me deixou acostumar com as severidades das circunstâncias. Com carinho e paciência, ele me ensinou que a verdade dissolve qualquer medo. E que minha felicidade é digna de muito respeito.
Hoje, dia em que tive a melhor sessão de terapia de todos os tempos, fui mais uma vez remetida à criança que eu fui. Porque eu faço muita questão de manter as coisas dela em mim. Porque eu sou essencialmente leve e desengessada, apesar de qualquer coisa. E é assim que preciso viver: com o coração tranquilo e com a vontade ingênua de encontrar alegria em tudo, até mesmo nas reconstrutoras tristezas. Foi deste modo que me tornei gente. É esta mulher que minha criança aplaude contente em meus sonhos.
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massa!
ResponderExcluiracho que tô exatamente no movimento de voltar a honrar a minha criança, mas não tinha essa clareza antes de ler seu texto. não à toa esse momento coincide também com meu retorno à terapia. massa, xará! valeu pelas inspirações ;)
e venha cá... vc desde sempre assim cativante, né??? :)
ResponderExcluirInvejo esta leveza dos taurinos... essa mania de alegria de vocês... este respeito... acho bonito de ver! :)
ResponderExcluirE "Será este o futuro que aquela menina merece?". Me dói pensar nisso. Análise já, rs.
(Eu te pediria pra assistir a série Being Erica, mas, blé, vc não vai me obedecer. rs)
Vai aqui o que eu tava (estou) postando agora no face:
"-Por que será- perguntou ele a Olívia- por que será que às vezes a gente tem a impressão de que acabou de nascer... ou de que o mundo ainda está fresquinho, recém saído das mãos de quem o fez?
[...]
Como se tivesse estado a rolar a pergunta no espírito, Olívia respondeu:
- São as clareiras que se abrem de repente para a gente poder vislumbrar Deus."
(Olhai os lirios do campo, Erico Verissimo, p. 85)
=*
eu acho que tô numa época meio inversa. passei bons anos refletindo sobre o passado. cheguei a conclusões importantes, mas hoje, o que mais tenho exercitado é minha conduta no presente, pra que no futuro, este presente, seja uma passado admirável :]
ResponderExcluirtamo junto!
te amo!
Xará,
ResponderExcluirbom início de terapia pra você! e dê muito carinho sempre mesmo à sua criança. né? =)
(oun, cativante é delícia!)
Diniz,
você sempre me vem com as melhores citações.
quero ver Being Erica sim, o que é?
Catita,
pensar na criança, neste momento, nem é refletir passado: é refletir presente mesmo! e vamos lá rumo ao futuro nosso de cada dia.
tiamu.
Que bonita essa lembrança. É uma maneira bacana de, em períodos de difíceis e de dúvidas das convicções, conseguir olhar para dentro e se ver, como a crianca sendo nossa mais verdadeira essência. É assim que eu viajei.
ResponderExcluiré isso!
Excluirlindo post, gerou profunda reflexão.
ResponderExcluirparabéns e obrigada.
obrigada e de nada!
ExcluirChorei.
ResponderExcluirCarla
suissatanner@hotmail
=)
ExcluirNossa, que lindo Paulinha!!! Acolher e procurar entender esta criança é TÃO importante... Que bom que você está se ocupando disto e melhor, de modo tranquilo, constante e sem pesos de responsabilidade. Eu mesmo preciso voltar à minha criança mais uma vez. Talvez seja que nem a reencarnação. Não necessariamente a crença, mas a sua dinâmica: oportunidades de rever e fazer diferente até a felicidade não deixar espaço para mais nada (minha leitura atual do fenômeno). Lindo as suas percepções aqui. E as do seu amigo também. Beijão!
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